O Estigma em Torno do Aborto

O que é estigma?

A ideia de estigma como conceito social surge no início dos anos 60 e desde então pesquisadoras e ativistas ligadas às ciências sociais e saúde pública têm tentado entender melhor como é que pessoas com determinadas características, identidades e/ou comportamentos são rotuladas como diferentes, qual é o impacto da rotulação na saúde dessas pessoas culturalmente entendidas como inferiores e como a rotulação estabelece uma base para a exclusão e descriminação a nível individual e social.

Estigma acerca do aborto?

É uma crença compartilhada de que o aborto é algo errado e/ou moralmente inaceitável em uma comunidade ou sociedade.

É um atributo negativo, conferido a mulheres que buscam interromper uma gestação e a qualquer pessoa relacionada ao aborto, que as demarca como inferiores. (KUMAR, 2009)

O estigma do aborto ocorre em todos níveis de funcionamento social

A nível cultural, as mensagens passadas são:

– Apenas mulheres más fazem aborto

– Um embrião tem mais valor que a mulher grávida

– “Bons abortos” são apenas aqueles conseguidos por causa de tragédias e dificuldades

– As mulheres devem sofrer após fazer um aborto como forma de redenção

– A decisão de fazer um aborto é inevitavelmente uma decisão difícil, sofrida, e a mulher está condenada a se arrepender e sentir culpa para sempre.

Fatores legais, governamentais e estruturais

Do ponto de vista estrutural percebe-se que estigma do aborto está embutido nos sistemas econômico, educacional, legal, de saúde e de assistência social porque as políticas e leis de qualquer país refletem sua ideologia assim como sua opressão histórica às mulheres. Nós enfrentamos obstáculos legais, financeiros e logísticos, risco de exposição, perda de benefícios e até de sermos presas por termos um aborto.

Fatores organizacionais e institucionais

Nas questões organizacionais percebe-se que as instituições perpetuam o estigma por meio de suas políticas, estruturas e normas. As instituições médicas fazem isso ao criarem obstáculos para o acesso a cuidados, como a recusa de fornecer serviços de aborto, recusa de tratar as complicações (caso ocorram), manejo insuficiente da dor, e recusa de fornecer cuidado pós-aborto. Eles também podem fornecer informação médica imprecisa ou incorreta com o objetivo de assustar ou envergonhar quem busca um aborto.

Fatores comunitários

A nível comunitário, as mulheres correm o risco de serem isoladas e julgadas por pessoas próximas, em locais religiosos, emprego, escola e outros sistemas coletivos. Elas podem ser rotuladas pela comunidade e serem negadas qualquer tipo apoio tradicional. Por causa disso, muitas têm medo de compartilhar suas experiências com amigos, família e parceiros.

Fatores individuais

Individualmente isso tudo está relacionado ao processo pelo qual nós interpretamos, racionalizamos e produzimos sentido à nossa experiência de aborto. A penetração do estigma na construção psico-emocional das pessoas é muito destrutiva e comumente se manifesta como vergonha e culpa. As mulheres podem se sentir egoístas ou imorais porque se percebem como pessoas que desafiam expectativas familiares, normas culturais ou ideias sobre a maternidade.

Com isso, podemos perceber que o estigma provoca danos sistemáticos de várias maneiras, diretas e indiretas, estando presente em todas as etapas que pessoa encontra durante esse processo, desde crenças pessoais à sociedade em geral. O estigma está representado nas barreiras no acesso aos cuidados, no julgamento e rejeição por pessoas próximas, e por vezes até mesmo nas crenças básicas da mulher sobre quem ela é e quem ela será se fizer o aborto.

Esse estigma serve para marginalizar um processo médico essencial, depreciar as pessoas que fornecem ou buscam aborto e enfraquecer aquelas que defendem sua legalidade e acessibilidade.

É crucial normalizar e falar sobre aborto como uma experiência comum, o aborto é uma parte comum da saúde reprodutiva e da vida da mulher e deve ser tratada dessa forma.